QUANDO ALGUÉM PERGUNTA A UM AUTOR, O QUE ESTE QUIS DIZER, É POR QUE UM DOS DOIS É BURRO.

MARIO QUINTANA

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Por que ainda não aprendemos a lidar com a democracia?

É consensual a idéia de que brasileiro não sabe lidar com democracia. Não faz bom uso do seu voto, não sabe cobrar as promessas de campanha, não monitora seus representantes durante o mandato, recebe com passividade as notícias de uso ilegal do dinheiro e da função pública, e por fim, reelege os maus políticos sucessivamente.

Seria muita ingenuidade negar tal realidade, mas é também muita intransigência querer comparar a nossa jovem democracia com modelos europeus, consolidados em um processo de formação longo e gradual, que em pouco ou nada se assemelha com o nosso.

Se fizermos um panorama rápido e simplista da história da república brasileira, nos depararemos com um óbvio que incomoda, temos mais experiências em golpes políticos e regimes antidemocráticos do que em pleitos presidenciais.

A história da nossa república, que de pública não tinha nada, já começa com um golpe militar, tramado pelas elites brasileiras. Após o curto período militar, outro golpe, tramado em gabinetes aristocráticos coloca o poder nas mãos das oligarquias cafeeiras, que sufocavam e subjugavam a participação popular, usando a tal democracia apenas para consolidar, com eleições de fachada, decisões políticas tomadas muito anteriormente nas salas dos coronéis.

Com o fim da política oligárquica (dado através de outro golpe, diga-se de passagem), nosso pleno exercício democrático continuou aguardando por mais 15 anos, para poder entrar em cena. Foram anos de ditadura varguista, que por seu caráter carismático e paternalista, quase convenceu o povo de que ditadura era uma coisa boa. Ainda mais sabendo que totalitarismo era, nesse período, a última moda na Europa, e que para todo o mundo a expressão “participação popular” soava como ameaça comunista e instabilidade político-economica.

Acabada a Segunda Guerra, e paralelamente o governo Vargas, nossa democracia tenta novamente se estabilizar junto à cidadania brasileira. Ledo engano, a volta de Vargas “pelos braços do povo” mostrou mais uma vez que o país não estava preparado para lidar com ela. E após um curto período de liberdade que coincidiu com os equivocados governos dos J’s ( Juscelino, Jânio e Jango), a democracia “perde a liberdade condicional, e retorna à prisão”.

Foram vinte e um anos de ditadura, toda uma geração aprendendo a receber a política pronta, acreditando que falar sobre política era crime, quase pecado tentar libertá-la da “Bastilha” na qual vivia enclausurada, por representar “risco à ordem social”, estando aqueles que o tentasse, condenados à morte ou coisa pior.

Com o fim da ditadura militar e os quatro mal fadados anos do governo Sarney, a tal cidadania pode finalmente ter o tão esperado reencontro com a democracia. E aí o eleitor que em sua maioria jamais tinha elegido um presidente, resolveu escolher um que em nada tivesse a ver com o espírito senil dos militares que tão bem conheceram. Elegeram um homem jovem, bonito e esportista, tudo que o país precisava.

O restante da história, todos nós conhecemos, impeachment, vice no poder. O governo FHC, que não só inventou o real, mas também a reeleição presidencial, pela qual o brasileiro se apaixonou - talvez por um saudosismo varguista - e provou essa paixão com os dois mandatos de Lula, que pelo que parece, seriam três, se a lei assim permitisse.

Em síntese podemos perceber que o brasileiro tem pouquíssima experiência em eleger presidentes, fato que se soma com outros complicadores, como a falta de instrução, a dificuldade do eleitor de lidar com informações e de entender essa miscelânea partidária que enlouquece qualquer cientista político dado à falta de coerência e ideologia que permeiam as alianças.

Atualmente o país brinca de ser democrático, transforma o horário político em apresentações de “stand up comedy” com direito a humoristas profissionais. E pior, a tal democracia que se aproveita de personagens pouco convencionais para se dizer ampla e irrestrita, acaba por ser uma disputa de quem tem mais “amiguinhos ricos” e influentes, ou seja, para poucos, os mesmos.

Ainda de forma superficial, podemos concluir que a democracia no Brasil é pouco funcional principalmente porque é conservadora e tem orgulho de sê-la. Ainda aristocrática, decide as disputas eleitorais em gabinetes de grandes empresários. Têm apego à reeleição e a perpetuação de oligarquias e até teocracias no poder. Possui uma justiça eleitoral que parece seguir aquele já velho e conhecido critério do “você sabe com quem está falando?”. E pior, acusa o eleitor, confuso, imediatista e pouco instruído, (como de fato tem que ser, dada qualidade da educação pública do país), que exerce o voto por obrigação legal, e não por interesse ideológico, de ser o responsável pelas mazelas políticas do país.

Se hoje o eleitorado continua sendo massa de manobra de uma democracia debilitada, é porque foi vítima de uma construção política marcada muito mais pelo clientelismo e pelo poder do mando e da força bruta, do que pelo cultivo e valorização da participação popular.


Monique Pacheco

Bacharel e Licenciada em História

Blog: moniquenajaraapacheco.blogspot.com

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