SIM EU SOU A FAVOR DA AMPLA LEGALIAÇÃO DO ABORTO, e quero
deixar isso claro, assim mesmo em letras garrafais. Sim, eu defendo a ampla
legalização do aborto, não por ser contra o direito a vida, ou por achar bacana
fotos de fetos jogados em esgoto, como tantos adoram publicar em redes sociais.
Eu sou a favor da ampla legalização do aborto, por que A LEGALIZAÇÃO DO ABORTO
É UM GRANDE PASSO NA BUSCA DO RECONHECIMENTO DA IGUALDADE ENTRE HOMENS E
MULHERES. E não, não estou falando nenhum absurdo, e não, não estou possuída
pelo diabo. A gravidez indesejada ainda é uma punição que apenas a mulher
recebe pelo ato sexual irresponsável. E sim, se estamos falando de um filho
indesejado, fruto de uma relação sexual desprotegida, que só à mulher vai caber
educar, cuidar e proteger por força de lei, então, sim, estamos falando em
castigo. E não, não estou sendo radical demais, e nem desumana. Desumanas são
as nossas leis sexistas. O mesmo país que proíbe o aborto é o que garante por
lei o dever legal, dos pais zelarem pela educação, saúde e segurança de seus
filhos. Dos pais, quais pais? Apesar de a lei falar sobre a educação legal dos
pais, a nossa cultura machista está sempre cobrando das mães, e apenas das mães
o dever moral de zelar pelos seus filhos, sejam eles desejados ou não. O que
seria justo, muito justo, se essa cobrança fosse feita à ambos genitores. O
homem pode simplesmente se eximir da obrigação, afinal, não existem leis que
obriguem a qualquer homem amar, educar, e proteger seus filhos. Ou alguém acha
que a obrigatoriedade do pagamento de pensão obriga algum homem a participar da
criação de seus filhos? Conheço vários homens que tem filhos fora do casamento,
e contribuem com apenas com o valor da pensão estipulado ao juiz, mal se
preocupa em se lembrar do dia do aniversário da criança. Oras, a ele foi dado o
direito de não querer aquele filho, e à mãe? A ela foi dado esse direito? Se
ela iria optar por gestar, gerar, criar e amar essa criança, é outra questão. A
pergunta aqui é: Por que a ela é negado o direito de decisão. E não sejamos hipócritas
em dizer que a mulher tem um dever moral de olhar e zelar por suas crias, por
força de seu “instinto materno”. Isso é hipocrisia, vivemos em uma sociedade
que se diz “civilizada” onde se encaixa o discurso sobre instintos no “planeta
homem”? É pra falar de instintos? Então tá, e o instinto de preservação da
vida? O instinto de preservação da espécie?
As mulheres são as únicas responsáveis morais por manter a vida no
planeta? São elas que, querendo ou não, precisam dedicar sua vida à criação de
um ser humano e manter a vida no planeta? Não, eu não sou um monstro, e não
detesto crianças, pelo contrário, tenho considerado bem pontualmente, e bem
apaixonadamente a idéia de ter um filho, uma vida, um fruto de um
relacionamento verdadeiro, que eu possa amar, educar, e passar um pouco dos
meus valores, como forma de minha continuidade e continuidade da vida de meu
parceiro no planeta. Mas não, não são as paixões e os acalorados discursos
religiosos que devem servir de base para uma discussão política e social tão
importante. Estamos falando em IGUALDADE de direitos. Estamos falando em uma
sociedade em que a mulher deixe de ser apenas escrava de homens e filhos, em um
sentido global e seja senhora de seu destino, com direitos e deveres iguais. Só
teremos uma sociedade igualitária quando a sociedade olhar para os homens e
dizer: “TOMA QUE O FILHO TAMBÉM É TEU”. Enquanto esse dia não chega, cabe à
lei, dar à mulher a mesma possibilidade que a cultura dá aos homens, a de
simplesmente escolher não ter o filho indesejado. E isso é fato. Mas, se por
acaso, você se recusa a abrir sua mente para o reconhecimento de que essa
impossibilidade legal ( de não querer uma criança) abriga um legado de
injustiças, pense um pouco na crueldade de uma lei, que obriga uma mulher
vítima de estupro de gerar, zelar, e principalmente AMAR, o fruto de uma
violência, de uma relação não consentida. Ou alguém acha que não existe na
obrigação legal de cuidar de uma criança, a obrigação de amá-la? É possível a
uma mãe criar de forma saudável um ser humano, criá-lo de forma a estar apto à
conviver com o outro em sociedade, sem uma verdadeira relação de amor? E o pai?
O estuprador? Qual legado vai levar dessa violência além do prazer momentâneo e
a, comumente, sensação de impunidade? Desde o início da construção de nossas
sociedades, a mulher é contabilizada junto à bois, vacas, e escravos, como
propriedade. Uma mulher vítima de um estupro era, na antiguidade, morta, ou
abandonada à prostituição. E hoje? Quantas mulheres são estupradas e não tem
coragem nenhuma de contar para alguém para que não lhe seja perguntado de forma
condenatória sobre a roupa que estava vestindo, e sobre o lugar onde estava
andando. Quantos estupradores, lançam todos os dias, mulheres à prostituição,
ao abandono, à miséria? Após algum tempo um estuprador, pode se livrar de seu
passado violento, ou pelo menos disfarçar sua índole agressora. Muitos se
casam, tem famílias, se convertem para determinadas religiões, tornam-se verdadeiros
bastiões da moral e dos bons costumes. E a vítima desse estupro, que carrega em
seus braços o filho de um homem que não conhece, que mal sabe onde está andando,
o do qual só tem lembranças de horror? Quem livra essa mulher do estigma de
estuprada? Quem apagará da vida dela a sua condição? Quem zelará pela sua saúde
psicológica e a de seu filho? O Estado? Com seu salário mínimo, com uma “indenização
estupro”, ao qual muitos ainda se levantam para condenar com o discurso podre: “Ah!
Agora um monte de mulher vai falar que foi estuprada só pra receber pensão do
governo, até eu queria ser mulher agora”. Eu quero que alguém me responda o que
existe de humano em uma lei que pune uma vítima de estupro. Uma lei que condena a mulher simplesmente por
ser mulher. Onde está o respeito à vida? Esse tipo de lei, só mostra o óbvio, a
intolerância sexual. O reconhecimento da superioridade de homens perante
mulheres. E não me venham falar das mulheres que legitimam esse reconhecimento,
por que é historicamente sabido que o dominado, por força de opressão e por
repetição ideológica, acaba, muitas das vezes, se apropriando do discurso do
dominador. Mas, eu NÃO, eu quero levantar aqui a minha bandeira e dizer, EU SOU
LIVRE, EU SOU HUMANAMENTE TÃO IMPORTANTE QUANTO QUALQUER HOMEM, MINHA VIDA
MERECE RESPEITO COMO A DE QUALQUER HOMEM, E EU EXIJO QUE A LEI RECONHEÇA ISSO.
Eu exijo uma lei menos machista e mais verdadeiramente igualitária.
Monique Pacheco
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