QUANDO ALGUÉM PERGUNTA A UM AUTOR, O QUE ESTE QUIS DIZER, É POR QUE UM DOS DOIS É BURRO.

MARIO QUINTANA

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Vamos combinar: flanelinha não é trabalhador informal, é bandido socialmente aceito.

Eu não sei você, mas eu não aguento mais ser refém de flanelinha. Não é exagero, somos reféns de um sistema diário de extorsão tão socialmente aceito que algumas cidades, como Belo Horizonte, já estão chegando ao cúmulo de institucionalizar essa “ocupação”. Pelo amor de Deus, flanelinha não pode e nem deve ser visto como trabalhador informal. Que tipo de trabalhador te obriga a usar os seus serviços? Não existem feirantes que te obrigam a comprar seus produtos, ou uma profissional do sexo que obriga alguém a transar com ela, mas o flanelinha te obriga a aceitar que ele “olhe” seu carro. Ou você conhece alguém que já se sentiu em condições de recusar o “favor” de um flanelinha?
Somos coagidos a dar dinheiro diariamente á esses bandidos. E esqueça aquelas pratinhas das quais você estava doido para se livrar, dependendo do lugar onde você estacionar seu carro o “dono do ponto” pode lhe cobrar de cinco a dez reais e exigir pagamento adiantado. E experimente dizer que não tem, ou que a rua não é dele. Um dia desses testemunhei, indignada, uma tentativa de argumento com um desses “trabalhadores”. Um rapaz, na tentativa de arrancar seu carro e após constatar que não tinha dinheiro para o tal “pagamento” foi obrigado a escutar frases absurdas como: “Não tem dinheiro, porque parou aqui?” “ Você senta em um bar e toma cerveja se não tem dinheiro para pagar?” “Esse é o meu trabalho, você está me roubando”. Fiquei perplexa, ainda mais após a tentativa do rapaz de chamar à sua defesa um policial que estava passando. “ Dá logo o dinheiro do cara e agente resolve isso” disse o policial. O rapaz ficou tão confuso, que sem chance de defesa, e talvez por falta de certeza sobre quem estava sendo roubado, teve que pedir o prestativo flanelinha para aguardar enquanto ele ia a um caixa rápido fazer o saque para o tal pagamento, sob ameaça de ter seu carro riscado. Acho que se as coisas continuarem como estão a procura por um caixa rápido será desnecessária, não demora e esses “profissionais liberais” estarão armados com maquinetas de cartão de crédito.
Fico pensando em como as coisas chegaram a esse ponto. Em quando esses marginais urbanos se apropriaram das ruas sem que nós, cidadãos de direito, pagadores de impostos tenhamos feito nada para impedir. O pior é que poucas pessoas enxergam a gravidade dessa questão. Um grande número de motoristas chegam ao cúmulo de achar vantagens nesse tipo de “prestação de serviço”, pensam ter seus carros realmente protegidos de furtos e roubos, e pior acham que custa mais barato manter o flanelinha que pagar estacionamento privado. Não deveria ser mais barato estacionar o carro na rua. Deveria ser gratuito, ou pelo menos legal, legal em todos os sentidos.
As pessoas fogem do parquímetro, e gastam mais com o “flanelímetro” e pior, alimentam essa rede de banditismo social que “emprega” pessoas de todas as idades. Pessoas que comungam de uma característica comum: sua disponibilidade para ganhar dinheiro fácil na famosa lei do menor esforço. Não defendo o parquímetro, mas o prefiro em relação á possibilidade de ficar criando “cobras para me picar”. Não sou elitista, nem direitista, nem liberalista ou qualquer outra coisa assim. Sou apenas uma cidadã cansada de ver pessoas incluindo o flanelinha em seu orçamento doméstico. O flanelinha não é um pobre coitado, é um bandido cotidianamente aceito, que se infiltrou na sociedade como baratas se infiltram em nossas casas. Você sempre acha que existe pragas mais ameaçadoras para combater, até que descobre que perdeu o controle sobre elas. Não temos mais controle sobre flanelinhas, eles se multiplicaram e dominaram as cidades de tal forma que agora vendem seus “pontos” para outros que queiram investir nesse lucrativo negócio.
Dia desses um babaca me disse com grande sorriso no rosto: “Conheço um professor, que fez faculdade e tudo, mas como ganhava pouco largou a escola e virou flanelinha, muito melhor, já comprou até um carro”. Que nojo dessa sociedade sem dignidade que se sente esperta, quando na verdade é desonesta. Me enoja também pensar que algumas pessoas acham isso legal. Não é legal, de forma nenhuma. Temos que dar um basta nessa situação. Como? O problema ficou grande demais para soluções simples, mas coragem para dizer não, participação política para cobrar intervenção do Estado, e principalmente responsabilidade social para não se render á lei do mais esperto, do mais fácil, do menor esforço seriam algumas alternativas na busca de soluções. Se tudo isso for impossível para você deve pelo menos, se indignar. Como diria sabiamente a colunista da Revista Época, Ruth de Aquino: “Uma pessoa indignada não é necessariamente uma pessoa raivosa. Indignar-se com a injustiça é estar alerta. (...) Felizes são os homens e as mulheres que não aceitam passivamente os malfeitos dos governos e dos indivíduos. A indiferença nos faz menos humanos. A resignação pode nos tornar cúmplices.” ( 27/12/10, p.138).
O que não dá é para achar normal. Para achar barato ser refém desses bandidos. Precisamos de políticas sociais melhores, e um sistema de segurança que realmente nos defenda desses assaltos homeopáticos. Mas até lá vou continuar me indignando, tentando ser um elo forte nessa corrente em busca de uma sociedade melhor, de uma vida mais digna para todos.

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